Irado

Denise Accurso


Cláudio nunca tinha levado um fora até então. Tampouco sequer tinha considerado essa possibilidade. Por isso, não sabia como agir. Sequer sabia o que sentir. Dominava-o uma sensação de traição.
Ela o olhava, como se esperasse uma resposta.
Abiu a boca e as palavras saíram:
– Vai tomar no cu. Sua puta!
A raiva o dominava. Como ela ousava dispensá-lo? O que ele ia dizer para os amigos? Com que cara ia aparecer e dizer que ela terminara com ele? Essa vaca.
Ela o olhava, parecendo chocada. Ele estendeu a mão e agarrou o braço dela, enterrando com força os dedos na sua carne. Viu a cara de dor, viu ela se contorcer, tentando se livrar.
Sacudiu-a com força e jogou-a longe. Ela caiu com tudo! Ouvia vozes à sua volta:
– Aquele cara…
– …Está batendo na guria…
– …Jogou ela longe…
Sentiu-se recuperado. Seu orgulho de macho estava intacto. Resistiu à tentação de olhar para trás, ver se ela estava machucada de verdade. Muita gente ia em direção a ela.
Ele não podia ser tratado assim. Por alguns minutos, desejou que fosse possível voltar atrás, até o momento em que ela disse que queria conversar com ele. Devia ter dito: “não sou homem de ficar de DR. Aliás, pra mim acabou. Já deu. Segue teu caminho”. Mas não, resolveu ouvir o que ela tinha a dizer. No fundo, no fundo, achou que ela queria consertar as coisas.
A raiva ia querendo ceder lugar à dor. Não permitiu. “Aquela vaca! Vagabunda imunda, perdi meu tempo com ela”.
No dia seguinte, a vida continuou. Para Cláudio, havia algo diferente. Sentia-se… estranho. Saiu para trabalhar. Na parada de ônibus, viu o ex-sogro. Abriu um sorriso, cumprimentando. O homem olhou para ele de cara fechada, sem responder. Um mal-estar, espécie de constrangimento, tomou conta de Cláudio. Será que é por causa de ontem? Será que ele sabe como foi de verdade? O que será que aquela vagabunda contou pra ele? Apesar de saber que estava certo, que tinha razão em ter feito o que fez, ainda sentia algo estranho que o atormentava e fora amplificado pela reação do pai dela.
Quando voltou do trabalho, foi ao bar próximo, encontrar seus amigos, bater um papo. Ao entrar, fez-se um súbito silêncio que o incomodou. Passou os olhos pelo ambiente.
Ela estava lá.
Uma onda de ódio o invadiu. Dominou-se. Dirigiu-se ao amigo mais próximo.
– E aí?
O outro o olhou em silêncio.
Cláudio irritou-se.
– Tô falando contigo! O que é que há?
– Desde quando tu bate em mulher?
Então era isso. A puta estava se queixando, envenenando os amigos e o pai dela contra ele, contando a história fazendo parecer que a vítima era ela, não ele. Eles eram homens, deviam saber o que são as mulheres nesse mundo.
Nesse momento, soube o que fazer para acabar com aquela difamação e manter sua reputação de homem que não leva desaforo pra casa.
Era isso, teria que matar a vagabunda.


 

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