Foguete
Denise Accurso
Eu e meu marido temos o hábito de fazer o que chamo de “caridade fria”, que é entregar valores ou donativos a intermediários que os levem a seu destino. Apenas uma vez nos envolvemos diretamente e a experiência foi intensa demais.
Há alguns anos, resolvemos passar a pegar cartas para o papai noel nos correios, na época do Natal, para realizar, na medida do possível, o desejo das crianças. Eu, pragmática, fui com a ideia de escolher aquelas cartas que pedem material escolar e roupas. Meu marido logo me convenceu do contrário. Muitas vezes, esses pedidos não são o real desejo das crianças, mas de seus pais. Ainda, disse ele, só porque a criança é carente ela não tem o direito de sonhar? De querer um brinquedo? De querer algo simplesmente para se divertir?
Ele me convenceu. Fiquei encarregada de comprar os presentes desejados. Houve um pedido de uma menina que deu mais trabalho: ela queria um foguete.
Nunca esqueci essa menina que sonhava com o espaço. Imaginava essa criança fantasiando com a Nasa, vendo programas de ficção científica e querendo estudar Astronomia. Lembrei de mim mesma, que, entre tantas outras coisas, já quis ser astrônoma. Lembrei de quando descobri que o sol era uma estrela como as outras. Lembro, ainda, com cerca de oito anos, de deitar para dormir e tentar imaginar o que seria o infinito. Essa ideia ocupou muitas noites minhas. Ficava pensando, a gente voa, voa pelo espaço e nunca acaba?
Rodei muito em Porto Alegre procurando um foguete adequado a essa pequena sonhadora. Achei alguns que, além de caros, me pareceram absolutamente sem graça. Até que encontrei um, enorme, colorido, com uma espécie de mola de lançamento, que se acionava com o pé e ele voava… modestamente, mas voava. Fiquei tentando imaginar o contentamento dessa pequena viajante do espaço com o foguete voador.
Onde andará essa menina? Lembro que tinha entre sete ou oito anos. Hoje deve estar na puberdade. Será que a vida foi generosa o suficiente para que ela não desistisse das estrelas? Tantos de nós se veem obrigados a abrir mão de alguns sonhos… Torço muito por essa pequena navegadora espacial.