Geni Oliveira
Improviso
A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios.
Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche. (Chaplin)
Ele chegou com o mesmo sorriso, olhos buscando os seus. Arranjara um novo emprego, teriam que vender a casa, mudar-se para a capital. Promessas vãs. E Lauren, pela primeira vez irredutível, apenas dizendo não. Não ao abandono, ao desrespeito, à insegurança. Não às noites insones, à angústia de não saber onde ele estivera. A muito custo recuperara a autoestima. Não poderia vê-la despencando novamente.
Valdir voltava depois de três meses, como se houvesse partido na véspera. Ela permitira essa situação. Perdoara sempre. Tropeços e recomeços. O olhar de estranhamento de seu futuro ex-marido causava-lhe uma alegria enorme.
Ele perguntou se poderia dormir em casa naquela noite, esperar que os filhos voltassem da escola. Por que não? No jantar, um silêncio constrangedor. Até mesmo o filho, apaixonado pelo pai, permanecia calado. Talvez Valdir tivesse pressentido que ali não era mais o seu lugar, se é que algum dia fora. Talvez o roteiro tivesse sido mudado na sua ausência. Como saber? Estranhou até o figurino da mulher e dos filhos. Algo destoava no cenário. Eram eles os protagonistas. Valdir, um mero figurante.
Lauren nunca gostou de portas trancadas. Ele dormiu no quarto dos filhos, atentos a qualquer movimento, pois conheciam a fragilidade emocional da mãe e as artimanhas do pai, que não hesitaria nem mesmo em recorrer às lágrimas. Naquela noite, ela adormeceu sorrindo. Talvez não fosse tão ruim viver de improviso.
Geni Oliveira