Nevrótica

Adriana Maschmann



Nevrótica

Dia desses, estava por aí, imaginando milhões de coisas, viajando por diferentes galáxias e universos ficcionais. Nenhuma novidade e quem me conhece sabe certinho como é. Tudo ia muito bem, novas histórias, personagens diferentes, aventuras mirabolantes, aquilo tudo. Uma sequência de tramas desfilava aos tropeços e alguma correria – porque as ideias têm pressa – quando, assim do nada, veio a tal neurose infestar meus projetos.

No começo, um sussurro. Espantei com a mão como quem afasta uma mosca. Insistente, voltou zumbindo e pousou no computador. Mudei de lugar, sentei perto da janela e tentei seguir escrevendo. Nada. Tarde demais. Os ovos, recém depositados, eclodiam, e as larvas se instalavam sobre as teclas. As fobias são mesmo assim, alastram antes de serem percebidas. E eu, desavisada, me contaminei. Difícil veneno para quem desconhece a cura.

Com medo, abandonei o texto. Impossível seguir a jornada sem saber o antídoto. Tirei os óculos, limpei as lentes. Tudo igual. Elas permaneciam ali, dominando todo o teclado e uma parte do monitor. Quis correr, jogar tudo longe, pedir socorro. Para quem?

Olhei as prateleiras em busca de qualquer alento. Tantos livros, tanto poder, tanta força. Haveria de encontrar um antígeno. Invoquei Bram Stoker, Charles Bukowski, R.R. Tolkien, R.R. Martin e Raymond Chandler. Do alto da estante, Annie Proulx me ofereceu o contraveneno. Direto na veia, a revelação: todos começaram tarde a escrever.

Cheia de coragem, voltei ao computador, exorcizei os pequenos demônios e passei, por via das dúvidas, um paninho com álcool só para garantir.

 

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