As perólas de um cérebro confuso

Vanderleia Reis

AS PÉROLAS DE UM CÉREBRO CONFUSO


Sempre acreditei que devemos viver o dia como se fosse o último e não nos apegarmos a pequenas coisas, nem alimentarmos sentimentos ruins, não é fácil eu sei, mas temos que tentar porque nunca sabemos o dia de amanhã e o que nos reserva.
Um tempo atrás recebemos a notícia que meu cunhado havia sofrido um AVC Hemorrágico, estava em estado grave no hospital, ficamos transtornados, os médicos nos davam o pior prognóstico, que ficaria sem mobilidade, sem fala e outras seqüelas.
Nunca perdemos a esperança e com a ajuda dos parentes e amigos fizemos várias orações e contrariando todas as expectativas, no quinto dia já havia saído da UTI. Claro, com algumas limitações, como a lesão era grande o cérebro levaria um tempo para se recuperar. Apesar de ter entendimento dos fatos o cérebro manda palavras que não condizem com o que ele quer falar. Aprendemos um novo vocabulário e separei algumas pérolas para dividir com vocês.
Eu não gosto muito de comer Piranhão (cenoura)
Eu também tenho uma bicicleta (blusa) igual a tua
Me dá meu dente (celular)
Me dá meu tijolo (celular)
Me dá meu carrinho de mão (carregador)
Coloca ali na torneira de pinga fogo (tomada)
Eu me queimei (AVC)
Me leva para o Pronto Socorro (banheiro)
As palavras que eu falo errado é por que vem de baixo do cainho (achamos que vem do cérebro)
Eu já falei para não deixar a mangueira dentro do aparelho de pressão (pilhas)
Que morango lindo (tomate)
Tenho um monte de borboleta para contar (histórias)
Tem que arrumar o câncer do computador (bateria)
Eu mesmo vou fazer a barba com o trator (aparelho de barba)
Vem cá Pitibiti (Valentino)
Fui cortar o cabelo depois fomos no Mosqueteiro (mercado)
O que me ajudou a ficar de pé foi a Herbácia (muleta)
A minha Mariele (muleta)
Ferramenta de Geladeira (muleta)
Amanhã vai vir o corrimão (Fisioterapeuta)
Fiz força na bolinha e tirei a tampa dos dedos (ponta)

Quando falei que estava anotando tudo o que falava errado, ele me olhou e disse: "Não vou falar mais, agora só por roseta (Mímica)" rimos muito.
Apesar de parecer triste levamos tudo no bom humor. Estamos aprendendo juntos, ele está evoluindo cada vez mais, só posso agradecer a todas as pessoas que de uma maneira ou outra ajudaram para que isso fosse possível. Saíram de sua zona de conforto para lhe dar carinho e amor, trocaram sua cama por uma poltrona de hospital, uma refeição por um lanche rápido, quando dava tempo, isso tudo fez a diferença e é nesses pequenos gestos que vejo a face de Deus.


Vanderléia Reis
Fev/2018

 

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