Gênesis Cervejeiro

Mario Ulbrich

Reinava sobre o abismo a escuridão. O Espírito de Deus pairava sobre o vazio num tempo infinito. Tudo era nada.
Tomado pelo tédio o Todo Poderoso criou a luz, separando-a das trevas e ao fazê-lo julgou ser bom o seu proceder. Fracionou o tempo, criou a noite e o dia. Depois, admirando a grandeza de sua obra, formou os mares, lagos, rios e fontes com a mais pura, saborosa e cristalina cerveja.
Na sequência decidiu-se a criar o ser humano à sua imagem e semelhança e homem e mulher os fez. Impôs a ambos uma única restrição que deveria ser observada à título de prova de obediência, sob pena de um castigo exemplar.
O homem e a mulher descumpriram a determinação Divina e comeram o fruto de uma tal de macieira. Deus como punição expulsou-os do Paraíso e transformou toda a cerveja criada em uma substância inodora, incolor, e sem sabor, que denominou de água. Colocou nela os peixes e milhões de outros seres aquáticos. Determinou ao casal humano o seu consumo, como condição de sobrevivência.
Vislumbrando a oportunidade de transformar o homem e a mulher em seus aliados, o Anjo Decaído roubou do Supremo a divina fórmula da cerveja e ensinou-os a produzir a sua própria. Para maior satisfação do casal instruiu-os para produzir vinho, hidromel e dezenas de outros destilados.
Sentiram-se homem e mulher poderosos, felizes e recompensados; deram as costas ao paraíso e foram viver vidas terrenas, adotando Sabazius, como deus.
O Divino Criador, irado com tamanha ingratidão praticada, fez o casal retornar à sua presença. Depois de muito meditar sobre sua vontade de extinguir ali mesmo, sem mais nem menos a raça humana, inclinou-se por uma alternativa menos drástica.
Retirou de ambos uma costela e implantou uma volumosa glândula anexa ao tubo digestivo que realiza sínteses e transformações complexas demais para o entendimento e aceitação dos amantes da cerveja, denominando-a de fígado.
Aquietou-os dizendo
- Vão em paz e se puderem gozem as delícias daquilo que lhes foi dado pelo Caído. É prudente terem sempre presente que Santa é apenas a sede, mas que a bebida constitui pecado!

 

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