Ernani

Viviane Bezzi

A ligação é interurbana, provavelmente São Paulo. É da companhia telefônica. Já é a enésima vez. Uma voz pra lá de melosa começa alugando seu tempo, como se você não tivesse mais nada para fazer. Oi bom dia, se você for o Ernani diga sim, se não for diga não. Depois de dizer não, a voz continua. Se você conhece o Ernani diga sim, se não diga não. Outro não. Mas ela não desiste. Ela quer que você mande um recado pro Ernani. Mas você não conhece o cara, que maluquice é esta? A esta altura já deu pra notar que a criatura não é uma pessoa. É uma máquina. Como explicar que você não conhece nenhum Ernani? A máquina não dá esta opção. Ela só quer saber do Ernani.

Este número de celular me pertence há muito tempo, como é que ele foi parar com o Ernani? E ainda não pagou a conta? Poxa Ernani, me ajuda né? Não vai me deixar com o nome sujo. Nunca passei por isso, nunca fiquei devendo, só me faltava agora tu começares a me atormentar com a tua dívida. Não né.

Há uns meses descobri que uma pizzaria publicou o meu celular no material de divulgação por engano. O cara até me propôs comprar meu número, mas não fechei negócio por que gosto muito da sonoridade dos algarismos, eles rimam, parece mais um poema. Sem contar ter que avisar todos os meus contatos da troca. Não foram poucas as encomendas de pizza, dúvidas sobre sabores e valores. Vocês têm tele entrega? Algumas vezes até dava vontade de espichar o assunto. Sim temos tele entrega, qual o sabor, qual o endereço. Mas seria sacanagem. Foram meses de tormento.

Agora que parece ter me livrado da pizzaria, começou o Ernani. O que será que tem este número? Quem será o próximo? Só espero não ser ninguém mal intencionado, nenhum detento, nenhum fraudulento. Também espero que o mesmo equívoco não se repita com cartão de crédito, conta de luz ou água. Contas particulares já são tantas, imagina mais as do Ernani. Aí já é demais!

 

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