Tapete sujo

Filipe Smidt Nunes

— Eu já levei ele da última vez.

— Nada disso. Eu que levei hoje de manhã.

— Mas ele me pediu pra fazer xixi hoje ao meio dia.

— Não importa, o nosso acordo é eu levo de manhã e tu leva de noite.

— Mas não é justo, só eu almoço em casa.

— Para de reclamar e leva o cachorro, coitadinho. Não tá vendo que ele tá se contorcendo todo?

— Para tu de fazer drama. Quem quis adotar esse cachorro foi tu.

— Olha só o que tu fez! Agora ele já fez xixi no tapete. Pega o pano e vai limpar.

— Eu não. Tu que deveria ter levado ele.

— Meu Deus do céu, tu não faz nada nessa casa.

— Pois é, acho que seria melhor que eu não morasse mais aqui.

— Eu também acho. Se é pra ter um peso morto que só come, peida e não limpa nada, melhor eu me virar sozinha.

— Me faz rir. Tu não aguentaria uma semana sem mim. Quero só ver com a primeira lâmpada queimada o que tu vai fazer. E quero também ver se tu vai aprender sozinha a colocar de volta essa porta do armário que vive caindo.

— Eu vou me virar. Me virava antes de te conhecer e vou sobreviver agora que tu finalmente vai embora.

— Tá bom, tá bom. Eu vou embora, mas com uma condição.

— Qual? Qualquer coisa pra me ver livre de ti.

— O cachorro vem comigo.

— Negativo! O cachorro é meu.

* Conto publicado no livro "Histórias não contadas nos almoços de domingo".

 

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